A expansão do gigante asiático na América Latina preocupa os Estados
Unidos, enquanto Pequim reforça sua presença em setores-chave como
defesa e sistema bancário
A influência da China no Brasil deixou de ser meramente comercial e agora se posiciona como uma estratégia geopolítica de longo prazo. Dois setores-chave — o militar e o financeiro — estão atraindo a atenção do governo de Xi Jinping, levantando suspeitas tanto no Congresso dos EUA quanto nas Forças Armadas brasileiras.
Um dos movimentos mais significativos é o interesse do conglomerado estatal chinês Norinco em estabelecer operações de defesa no estado da Bahia e adquirir uma participação na empresa brasileira de sistemas de mísseis Avibras. Durante a visita do presidente Luiz Inácio Lula da Silva à China em maio, ele se encontrou pessoalmente com o CEO da Norinco, Cheng Defang, abrindo caminho para futuras colaborações nos setores militar, de segurança pública e de produção de armamentos no Brasil.
O jornalista William Waack , em artigo no jornal O Estado de São Paulo, alertou que o objetivo da China é transformar o Brasil em um centro de operações militares para a América Latina, desafiando o domínio histórico de potências como Estados Unidos, França e Alemanha. A Norinco, sancionada pelos EUA por ligações com o programa de mísseis do Irã, também foi acusada de supostamente fornecer armas ao Hamas e de componentes encontrados em armas russas na Ucrânia.
Além do interesse na Avibras, a proposta da Norinco inclui o fornecimento do sistema de defesa aérea Sky Dragon 50, tanques VT4 e tecnologias baseadas em inteligência artificial, todos com possibilidade de fabricação local. As negociações ocorrem em meio ao aumento das tensões entre o Brasil e os EUA, em um momento em que Washington mantém cooperação ativa com as Forças Armadas brasileiras, incluindo a recente compra de mísseis Javelin e helicópteros Black Hawk .
Sistema financeiro: um novo campo de disputa
Ao mesmo tempo, o avanço da China no setor financeiro brasileiro está se acelerando. A Mastercard anunciou que será o primeiro banco latino-americano a aderir ao Sistema Interbancário Internacional da China (CIPS), uma plataforma projetada por Pequim para facilitar pagamentos internacionais em renminbi, a moeda oficial da China, contornando assim o sistema financeiro ocidental, dominado pelo dólar.
A chegada da UnionPay, a maior rede de cartões de crédito da China, também representa um marco. Sua operação no Brasil está vinculada ao sistema CIPS e é vista como parte fundamental do projeto do BRICS para desdolarizar o comércio internacional.
O economista Hugo Queiroz alertou ao veículo O Antagonista que esses avanços, embora apresentados como desdobramentos de mercado, têm um forte componente político. "Isso pode desencadear retaliações dos Estados Unidos, principalmente se for percebido como uma manobra para driblar sanções internacionais", observou.
Do ponto de vista militar, o professor Robert Evan Ellis, da Escola de Guerra do Exército dos EUA, alerta que a cooperação com a China pode permitir que o Exército de Libertação Popular (ELP) obtenha conhecimento das estruturas militares latino-americanas, uma vantagem no caso de um conflito com Washington, por exemplo, sobre Taiwan.
Uma mudança na América Latina?
A estratégia de Pequim é consistente com sua Iniciativa de Segurança Global (GSI) e com os objetivos delineados nos Livros Brancos de Defesa de 2015 e 2019. Durante a reunião China-CELAC em maio, Xi Jinping reafirmou seu compromisso com uma "zona de paz" nas Américas, mas sob uma lógica de segurança paralela à oferecida pelo Ocidente.
Enquanto isso, os Estados Unidos continuam monitorando de perto esses movimentos. A crescente proeminência da China no Brasil levanta questões sobre a soberania estratégica, o papel dos BRICS e o equilíbrio geopolítico da região.
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