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09 dezembro, 2025

Star Air prepara pedido histórico de até 50 aeronaves Embraer para revolucionar conectividade regional na Índia

Companhia indiana deve fechar primeiro grande acordo direto com fabricante brasileiro, podendo abrir caminho para instalação de linha de montagem no país


*LRCA Defense Consulting - 09/12/2025

Em um movimento que pode redefinir o panorama da aviação regional indiana, a Star Air, maior operadora regional privada do país, está nos estágios finais de negociação para um pedido substancial de aeronaves Embraer, com previsão de até 40 a 50 jatos regionais. O acordo, que deve ser formalizado em 2026, representa não apenas a expansão mais ambiciosa da companhia desde sua fundação em 2019, mas também o primeiro grande pedido direto de uma companhia aérea indiana ao fabricante brasileiro.

A história da Star Air é peculiar no setor: enquanto dezenas de operadoras regionais indianas faliram ou abandonaram o mercado nos últimos anos, a companhia do grupo Sanjay Ghodawat conseguiu não apenas sobreviver à pandemia de COVID-19, mas prosperar. Hoje, opera 11 jatos Embraer, quatro deles são E175 e os demais E145, conectando 31 cidades através de 56 voos diários.

"Iniciamos nossas operações em janeiro de 2019 com uma única aeronave Embraer usada", conta Shrenik Ghodawat, diretor-gerente da companhia. "Mesmo durante a pandemia, mantivemos os pagamentos a todos os lessores e garantimos a estabilidade de nossos funcionários. Essa disciplina financeira nos permitiu continuar crescendo quando outros enfrentavam incertezas severas."

Plano de voo ambicioso
O plano de expansão da Star Air é igualmente ousado quanto estratégico. A companhia almeja atingir uma frota de 20 aeronaves até abril de 2028, marco que a qualificará para operações internacionais sob as regulamentações indianas. Mas a visão de longo prazo é ainda mais impressionante: 50 aeronaves até 2030, incluindo helicópteros, num crescimento anual de 8 a 10 unidades.

Atualmente, a Star Air possui quatro aeronaves próprias, enquanto as outras sete são arrendadas. A companhia foi pioneira na operação do Embraer E175 na Índia, oferecendo uma cabine mais confortável que os turboélices tradicionalmente usados em rotas regionais, com configuração de 12 assentos na classe executiva e 64 na econômica, um diferencial importante em mercados de baixa densidade.

O financiamento para essa expansão já está parcialmente garantido. A Star Air completou a primeira fase de uma captação Série B de 350 crores de rúpias (aproximadamente US$ 42 milhões), recursos que serão direcionados não apenas para aquisição de aeronaves, mas também para desenvolvimento de infraestrutura própria de manutenção, reparo, revisão (MRO) e treinamento de tripulações.

Programa UDAN: o combustível do crescimento
Central para o sucesso da Star Air está o programa governamental UDAN (Ude Desh ka Aam Nagrik - "Deixe o Cidadão Comum Voar"), lançado em 2016 pelo primeiro-ministro Narendra Modi. O esquema revolucionário oferece subsídios de viabilidade para companhias aéreas que operem rotas para aeroportos mal servidos em cidades de segunda e terceira categorias.

Aproximadamente 65% dos 56 voos diários da Star Air operam sob o esquema UDAN, gerando entre 200 e 250 crores de rúpias (US$ 24-30 milhões) em subsídios anuais. A companhia já transportou quase 1,5 milhão de passageiros desde o início, sendo a única operadora regional a completar seis anos ininterruptos no programa.

O governo indiano recentemente ampliou seu compromisso com a conectividade regional. No Orçamento da União 2025-26, a ministra das Finanças Nirmala Sitharaman anunciou um esquema UDAN modificado que adicionará 120 novos destinos e transportará 40 milhões de passageiros adicionais na próxima década, com alocação orçamentária de 540 crores de rúpias (US$ 65 milhões) para o ano fiscal de 2026.

"O esquema UDAN transformou completamente a paisagem da aviação regional", explica o capitão Simranjit Singh Tiwana, CEO da Star Air. "Estamos conectando a 'Índia Real', cidades que nunca tiveram acesso regular ao transporte aéreo. Isso não é apenas sobre aviação; é sobre desenvolvimento econômico e inclusão social."

Embraer na Índia: uma aposta de alto risco e alta recompensa
Para a Embraer, o potencial pedido da Star Air representa muito mais que uma simples venda de aeronaves, sendo a chave para entrar de forma significativa em um dos mercados de aviação de crescimento mais rápido do mundo.

A Índia, com sua população de 1,4 bilhão de habitantes e PIB crescendo entre 7,6% e 7,8% anualmente, é vista como o futuro da aviação global. Grandes companhias como IndiGo e Air India já fizeram pedidos massivos de jatos de corredor único da Airbus e Boeing (mais de 1.000 aeronaves combinadas), mas o segmento regional permanece relativamente inexplorado.

O executivo da Embraer, Raul Villaron, chefe da região Ásia-Pacífico, deixou claro o tamanho da oportunidade: "A Índia apresenta uma vasta oportunidade para jatos regionais no segmento de 80 a 150 assentos. Se conseguirmos fechar pedidos de cerca de 200 aeronaves, fará forte sentido empresarial localizar de forma mais agressiva, incluindo estabelecer uma linha de montagem final e expandir nossa base de fornecedores aqui."

A Embraer estima que a Índia necessitará de pelo menos 500 aeronaves neste segmento nos próximos 20 anos, impulsionadas pelas necessidades crescentes de conectividade além das rotas metropolitanas.

Linha de montagem: um divisor de águas estratégico
A proposta da Embraer de estabelecer uma linha de montagem final na Índia não é mera retórica comercial. O fabricante brasileiro já possui precedentes de sucesso com produção localizada, opera linhas de montagem na China e tem acordos de cooperação técnica em vários países.

Para a instalação na Índia, a Embraer já formalizou uma parceria com o Mahindra Group, um dos maiores conglomerados industriais indianos. Em setembro de 2024, as empresas assinaram um memorando de entendimento (MoU) para desenvolver uma cadeia de suprimentos local extensa, incluindo componentes aeroestruturais, compósitos e aviônicos.

Mais recentemente, em setembro de 2025, a Star Air assinou seu próprio MoU com a Hindustan Aeronautics Limited (HAL), empresa estatal indiana, para estabelecer uma unidade dedicada de MRO para aeronaves Embraer em Ozar, perto de Nashik. Esta instalação complementaria perfeitamente uma eventual linha de montagem.

"Uma linha de montagem na Índia transformaria o ecossistema aeroespacial do país", observa um analista do setor que preferiu não se identificar. "Não se trata apenas de montar aviões; é sobre transferência de tecnologia, desenvolvimento de fornecedores locais, geração de empregos qualificados e criação de expertise técnica."

A condição de 200 aeronaves estabelecida pela Embraer parece realista quando se considera o contexto mais amplo. A IndiGo, maior companhia aérea indiana com 64,2% do mercado doméstico, está avaliando um pedido separado de até 100 jatos regionais, considerando ATR 72, Airbus A220 ou Embraer E175. Se ambas as companhias optarem pela Embraer, o limiar de 200 unidades seria facilmente alcançado.

Desafios e oportunidades em um mercado complexo
Apesar do otimismo, o caminho à frente não é isento de desafios. A aviação regional na Índia tem sido historicamente um mercado difícil. SpiceJet, GoFirst (antiga GoAir), TruJet e várias outras operadoras tentaram e falharam em estabelecer operações regionais sustentáveis.

Os desafios são múltiplos: infraestrutura aeroportuária limitada em cidades menores, baixa demanda inicial em rotas inexploradas, custos operacionais relativamente altos para mercados de baixo rendimento, e dependência crítica de subsídios governamentais.

"O esquema UDAN é essencial, mas não é uma solução mágica", admite um executivo de uma companhia aérea concorrente. "Você precisa de disciplina operacional excepcional, gestão de custos rigorosa e, acima de tudo, paciência para que os mercados se desenvolvam. A Star Air demonstrou todas essas qualidades."

A escolha de aeronaves também é estratégica. Os E175 da Embraer, com autonomia de até 3.700 km e capacidade para 76-88 passageiros dependendo da configuração, são ideais para rotas regionais indianas. São suficientemente grandes para serem economicamente viáveis mesmo em mercados de densidade moderada, mas não tão grandes que exijam altas taxas de ocupação para lucratividade.

Comparativamente, aeronaves maiores como o Airbus A320 (180 assentos) ou mesmo o A220-100 (125 assentos) podem ser grandes demais para muitos mercados regionais indianos inicialmente. Por outro lado, os turboélices ATR 72 (78 assentos) têm menor alcance e velocidade, limitando sua utilidade em rotas mais longas.

Implicações geopolíticas e industriais
O potencial acordo Star Air-Embraer também tem ramificações geopolíticas interessantes. O Brasil, como membro dos BRICS junto com a Índia, tem buscado ativamente aprofundar laços econômicos bilaterais. A aviação poderia ser um setor catalisador.

Já há precedentes de cooperação: a Força Aérea Indiana opera cinco jatos VIP Embraer e três aeronaves de alerta precoce EMB 145 AEW "Netra". O governo indiano também possui aeronaves Embraer em serviço. Esta familiaridade técnica existente reduz barreiras para expansão comercial.

Além disso, o Brasil sinalizou disposição para comprar equipamento militar indiano em acordos de reciprocidade, uma dinâmica que nem Estados Unidos nem Europa ofereceriam com a mesma abertura. Em particular, o Brasil teria demonstrado interesse no caça Tejas LCA, desenvolvido domesticamente pela Índia, e no sistema antiaéreo Akash.

"As relações Brasil-Índia têm potencial subestimado", comenta um diplomata brasileiro em Nova Délhi. "Ambos são mercados emergentes com capacidades industriais sofisticadas e aspirações de maior protagonismo global. A aviação civil e defesa são áreas naturais para cooperação aprofundada."

Contexto competitivo
A Star Air não está sozinha na corrida pela expansão regional. A Alliance Air, agora de propriedade do governo indiano, é a segunda maior operadora regional com 20% de participação no segmento de turboélices. A SpiceJet, apesar de suas dificuldades financeiras, ainda opera alguns turboélices Q400 da Bombardier.

Novos entrantes também estão surgindo. A Fly91, lançada em 2024, e a IndiaOneAir estão tentando estabelecer nichos no mercado regional. No entanto, nenhuma dessas possui a escala, experiência operacional ou saúde financeira da Star Air.

A IndiGo representa tanto uma oportunidade quanto uma ameaça potencial. Com seus 45 ATR 72-600 servindo 65 destinos domésticos e gerando 2.405 voos semanais de ida em maio de 2024, a gigante de baixo custo domina o segmento regional. Seu possível pedido de 100 aeronaves regionais poderia tornar difícil para operadoras menores competirem.

Contudo, o mercado indiano é suficientemente grande para múltiplos players. Com mais de 400 aeroportos subutilizados e centenas de pares de cidades sem serviço aéreo regular, há espaço para crescimento significativo de várias companhias.

Projeções e cronograma
Se o acordo se concretizar conforme esperado em 2026, as primeiras entregas poderiam começar já em 2027, embora 2028 pareça mais realista considerando prazos de fabricação e certificação. A Embraer tem capacidade de produção de aproximadamente 90-100 jatos comerciais por ano em suas nidades fabris brasileiras, mas um pedido indiano grande provavelmente aceleraria planos para a linha de montagem local.

A Star Air planeja adicionar aeronaves gradualmente: duas em 2025, quatro em 2026, e depois acelerando para 8-10 anualmente até 2030. Este ritmo permite integração operacional adequada, treinamento de tripulações e desenvolvimento de rede sem sobrecarregar os recursos da companhia.

"Não estamos com pressa de crescer de forma insustentável", enfatiza Ghodawat. "Vimos o que aconteceu com operadoras que expandiram rápido demais. Nosso crescimento será medido, financeiramente sólido e focado em criar valor de longo prazo."

Impacto no desenvolvimento regional
Além das implicações comerciais, o impacto do plano de expansão da Star Air no desenvolvimento regional da Índia poderia ser transformador. Muitas cidades de segunda e terceira categorias na Índia têm populações de centenas de milhares ou milhões, mas conectividade aérea limitada ou inexistente.

Cidades como Gondia, Jharsuguda, Jagdalpur, Hubli, Belagavi e dezenas de outras agora têm serviço aéreo regular pela primeira vez. Isso não apenas economiza horas de viagem para residentes, mas catalisa desenvolvimento econômico ao facilitar turismo, investimento empresarial e comércio.

"Quando você conecta uma cidade remotamente via aérea, vários efeitos em cascata acontecem", explica um economista especializado em infraestrutura de transporte. "Investimentos industriais aumentam, turismo decola, jovens profissionais podem retornar às suas cidades natais, serviços médicos e educacionais melhoram. É desenvolvimento econômico em sua essência."

Estudos sobre o impacto do programa UDAN mostram benefícios mensuráveis: crescimento no PIB regional, aumento no emprego, maior atividade turística e melhoria na qualidade de vida. A expansão da Star Air amplificaria esses efeitos.

Um momento decisivo
O potencial pedido de até 50 aeronaves Embraer pela Star Air representa um momento decisivo não apenas para a companhia, mas para a aviação regional indiana como um todo. Se bem-sucedido, poderia:

  • Estabelecer a Star Air como player dominante em aviação regional indiana;
  • Trazer a Embraer para o mercado indiano de forma significativa;
  • Catalisar o estabelecimento de uma linha de montagem e cadeia de suprimentos aeroespacial local;
  • Demonstrar a viabilidade do modelo de aviação regional subsidiada a longo prazo;
  • Estimular desenvolvimento econômico em centenas de cidades de segunda e terceira categorias.

Os próximos 12 a 18 meses serão cruciais. A formalização do pedido, os termos de financiamento, o avanço das discussões sobre a linha de montagem e a execução inicial do plano de expansão determinarão se esta ambição se torna realidade ou apenas mais uma promessa não cumprida no volátil setor de aviação regional indiana.

Por enquanto, os sinais são encorajadores. A Star Air demonstrou resiliência e disciplina raras. A Embraer está comprometida com o mercado indiano. O governo continua apoiando conectividade regional. E a demanda subjacente está lá, esperando para ser desbloqueada.

Como observou o capitão Tiwana: "Estamos construindo algo especial aqui, não apenas uma companhia aérea, mas uma ponte conectando a Índia Real ao resto do país e ao mundo. E estamos apenas começando".

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