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14 maio, 2022

Guerra na Ucrânia faz fundos reverem restrições a fabricantes de armas

Os fundos ESG, que jamais olharam para ações de empresas do setor da Defesa, estão mudando rapidamente de opinião. E esses papéis estão voando nas Bolsas de Valores.


*Exame, por Carlo Cauti - 09/05/2022

Até pouco tempo atrás os fundos e gestores ESG ficavam bem longe de ações de fabricantes de armas.

Fabricantes de caças-bombardeiros, tanques e metralhadoras nunca estiveram no radar dos investidores ESG, mesmo que essas empresas tenham um papel importante em termos de crescimento econômico, tecnológico e, especialmente, de segurança nacional.

Essa tendência de esnobar, ou até difamar empresas do setor da Defesa por parte de fundos ESG perdurou por anos, mas a partir do dia 24 de fevereiro, o mercado mudou.

Vladimir Putin invadiu a Ucrânia e conseguiu alterar a percepção dos gestores de fundos ESG sobre as ações de empresas produtoras de armas. A invasão russa da Ucrânia mudou o jogo no caso das abordagens dos investidores em relação às suas estratégias ambientais, sociais e de governança, o famoso acrônimo ESG.

Fundos ESG vão às compras de ações de produtores de armas
Foi o caso do Skandinaviska Enskilda Banken (SEB), um dos maiores bancos da Suécia. Há um ano, a instituição financeira sueca proclamou que nenhum de seus 100 fundos jamais compraria uma ação de empresas produtoras de armas.

Mas no primeiro de abril, seis fundos do SEB voltaram a comprar ações de empresas do setor de Defesa, como a Saab, fabricante sueca de aviões de combate (que inclusive está fornecendo seus modelos Gripen ao Brasil).

Não por acaso, as ações da Saab na Bolsa de Valores de Estocolmo passaram de 220 coroas para 415 coroas de fevereiro até maio, chegando a dispararam 30% em cinco dias.

A única exclusão que ainda está valendo para os fundos da SEB é sobre investimentos em empresas que fabricam, desenvolvem ou vendem armas que violem convenções internacionais ou que estejam envolvidas no desenvolvimento de armas nucleares.

Comprem, pois o mercado não vai julgar
Segundo os analistas do Citi, “a partir de agora, o setor da Defesa será considerado cada vez mais como uma necessidade que facilita a adoção de critérios ESG para os negócios, mantém a paz, a estabilidade e outras coisas socialmente justas”.

Traduzindo para o bom português: está liberado comprar papéis de produtores de armas. E o mercado não vai julgar os fundos que operarem nesse sentido. Muito menos puni-los.

É incrível como, poucas semanas após a invasão da Ucrânia, a indústria de armas começou a brilhar de luz própria os olhos de gestores que até poucos meses atrás - especialmente nos Estados Unidos e no norte da Europa - sequer olhavam para esses ativos.

Se em janeiro os papeis de produtores de armas estavam junto com os das usinas a carvão e produtores de tabaco, agora o jogo parece ter mudado de vez.

Amor a primeira vista, pelos lucros
Essa mudança repentina de rumo dos gestores de fundos ESG não é apenas motivada pelos temores de outras possíveis investidas de tropas russas em outros países, principalmente Finlândia ou Suécia.

O que também está catalizando as atenções dos executivos do mercado financeiro é uma razão muito mais pragmática: o MSCI Defense and Aerospace Index - o índice que reúne as principais empresas do setor de Defesa do mundo - subiu 17% desde o começo de 2022.

Um desempenho estelar que só ocorreu outras duas vezes desde 1999 e que se torna ainda mais interessante comparando com o resto do mercado financeiro, que está sofrendo, nesse 2022, a alta de juros por parte dos Bancos Centrais do mundo inteiro.

E essa alta de dois dígitos do índice dos produtores de arma poderia ser apenas a ponta do iceberg. Em resposta à invasão de Putin, a Alemanha anunciou investimentos de 100 bilhões de euros (cerca de R$ 550 bilhões) nas Forças Armadas.

A ideia é chegar em breve a 2% do Produto Interno Bruto (PIB) da Alemanha, maior economia da Europa, investido na Defesa de forma permanente. Isso daria ao país europeu o terceiro maior orçamento da Defesa do mundo e vai provocar um aumento maciço dos gastos em equipamentos militares.

Ou seja, a previsão no horizonte é mais faturamento para as empresas produtoras.

Não por acaso, desde o primeiro dia da “operação militar especial” de Putin na Ucrânia, as ações da Rheinmetall (empresa que produz tanques para países da OTAN) literalmente explodiram: alta de 160% na Bolsa.

E, além da Alemanha, outros países prometeram aumentar seus gastos militares, o que vai resultar em um aumento nos estoques de defesa.

Entre eles, Polônia, Romênia, Suécia, Dinamarca e China já anunciaram aumentos no orçamento da Defesa, enquanto o Reino Unido, França e Canadá estão considerando aumentos no futuro próximo.

Fundos ESG estavam vendidos, agora voltaram a comprar
Com um cenário como esse, os gestores tiveram que se virar.

Se no início do ano, alguns gigantes da gestão de ativos tinham posições vendidas em ações de empresas da Defesa, agora tiveram que mudar rapidamente de rumo.

É o caso da BlackRock que estava apostando contra a empresa britânica BAE ou contra a italiana Leonardo.

Agora a ordem é: recomprar.

Afinal, como explicou recentemente o primeiro-ministro da Letônia, o que é mais ESG do que a segurança nacional?
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O conceito ESG e a segurança individual, familiar, comunitária e nacional

*LRCA Defense Consulting - 14/05/2022

No entender desta Consultoria, a frase do Primeiro-ministro da Letônia é a chave para se entender a nova realidade do conceito ESG.

Ou seja, quando se fala em "Ambiental", está se falando que comunidades, países e, enfim, o planeta precisam ter segurança ambiental para poderem sobreviver e se desenvolver. Já o "Social" pode ser entendido como a segurança social que a comunidade precisa para ter suas necessidades básicas atendidas e para ser feliz e próspera. Por fim, a "governança corporativa" se traduz pela segurança que funcionários e acionistas necessitam para que possam, respectivamente, trabalhar e investir na empresa nas melhores condições possíveis.

Ao fim e ao cabo, o conceito ESG está umbilicalmente vinculado ao de segurança. Por extensão - e a guerra atual está demonstrando isso - não haverá segurança ambiental, social e de governança corporativa se os cidadãos, as comunidades e os países não puderem garantir a segurança individual, familiar, comunitária e nacional.

Em consequência, essa mudança de percepção dos Fundos ESG poderá impactar profunda e positivamente as empresas brasileiras do Setor de Defesa listadas em bolsas de valores, especialmente a Embraer e Taurus Armas.

A Embraer há muito já trilha um caminho ESG, com diversas iniciativas nesse sentido, inclusive as ligadas aos combustíveis sustentáveis para aviação.

Com relação à Taurus, no release de resultados do 1T22, o seu CEO, Salesio Nuhs, assim escreveu:
"A pauta ESG (sigla em inglês para “ambiental, social e governança corporativa”) está dentre as prioridades de nossa agenda. No ano passado, por uma decisão minha, solicitei que iniciássemos conversas com diversas consultorias sobre o tema ESG e escolhemos como nossa parceira a Ernst & Young, com a qual nos identificamos levando em conta sua metodologia e credibilidade.

Esse processo vem sendo conduzido diretamente sob minha supervisão. No momento, estamos na fase das entrevistas com a alta direção, gerentes e colaboradores envolvidos diretamente nos processos, bem como, a análise de empresas que entendemos ter relação com a Taurus.

O Projeto ESG vem agregar novas ideias e compartilhar as ações que essa direção já vem adotando ao longo de sua administração para sustentar os interesses de longo prazo dos investidores, alinhado aos interesses dos colaboradores, fornecedores, comunidade e meio ambiente.
"

Considerando a conjuntura atual, quando as ações de ambas as empresas se encontram subavaliadas na Bolsa de Valores brasileira, é razoável supor que estas possam ser vistas como uma excelente oportunidade para Fundos ESG e para outros com viés semelhante, antes impedidos - por estatuto ou  por norma não escrita - de nelas investirem.

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