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03 abril, 2024

Avibrás: Empresa Estratégica de Defesa?


*LinkedIn, por André Luís Vieira - 02/04/2024

"Edgar, le Brésil n'est pas un pays sérieux" (frase atribuída ao embaixador brasileiro Carlos Alves de Souza Filho e dita ao jornalista Luís Edgar de Andrade, à época correspondente do Jornal do Brasil em Paris).

Diante de desafios regulatórios e orçamentários cada vez mais dependentes de ciclos políticos absolutamente ideologizados, o mercado interno para tecnologias de emprego dual se apresenta incapaz de preservar sua base de indústrias tecnológicas.

Se, do ponto de vista estritamente societário, as relações de "livre mercado" permitem a licitude de aquisições, fusões e incorporações entre empresas e grupos econômicos, do ponto de vista estratégico, assistir passivamente que empresas estratégicas sejam transferidas ao controle estrangeiro, só reforça a miopia institucional a qual nos encontramos aprisionados há décadas.

Como rememorado, empresas de grande potencial técnico-científico, tais como Mectron, Omisys, Optoeletrônica, Aeroeletrônica e Engesa vivenciaram destinos correlatos. O processo de desarticulação das capacidades em tecnologias críticas instaladas no País segue a lógica habitual. Circunstâncias diferentes. Mesmas razões.

E para quem não se apercebeu, além de parte significativa de domínio tecnológico sobre o acervo de capacidades dissuasórias do Exército Brasileiro, calcado sobre o sistema Astros, a Avibrás vinha desenvolvendo protótipos patrocinados pela FINEP, visando o reposicionamento do programa aeroespacial brasileiro.

Diante disso, restam alguns questionamentos. Qual país dotado de pretensões internacionais abre mão de sua indústria vocacionada para tecnologias críticas? Estamos fadados à atividades de P&D apenas para melhorar a exploração e produção de commodities? Estamos confinados ao conceito de país usuário/importador de tecnologias, enquanto espécie de neocolonialismo? E mais. Seria a autonomia tecnológica, traçada como um dos objetivos primordiais da PND, apenas retórica?

A sinergia entre as políticas públicas de defesa e de ciência e tecnologia é crucial para o desenvolvimento socioeconômico nacional. Não enxergar isso, é persistir na miopia institucional que nos mantém vassalos das economias mais modernas. O motivo? Simples. Enquanto o mercado internacional de commodities preserva os fundamentos econômicos mais próximos ao conceito teórico de concorrência perfeita, o mercado internacional de tecnologia apresenta as bases para a busca de novos mercados, mediante a integração com as cadeias globais de valor.

A colaboração e integração entre agentes da inovação são fundamentais para promover o transbordamento tecnológico do país e fortalecer suas capacidades tecnocientíficas. Em vista disso, políticas públicas devem efetivamente desempenhar seu papel na criação de um ambiente institucional propício para essa colaboração, promovendo a harmonização de preferências e coordenando ações conjuntas em busca da inovação.

A atuação estratégica do Estado como indutor da inovação, conforme a literatura mais abalizada, é essencial para definir áreas prioritárias de P&D e criar os instrumentos para o seu fomento. Portanto, a colaboração entre instituições científicas e tecnológicas civis e militares, a indústria e a universidade, se torna crucial para uma abordagem multidimensional na consolidação de um robusto sistema nacional de inovação.

Assim, o país poderia alcançar uma posição de destaque no cenário internacional, garantindo, ao mesmo tempo, sua soberania tecnológica e promovendo seu desenvolvimento econômico e social.

Entretanto, ao que parece, seguimos na contramão das tendências internacionais, justamente por nos manter apegados ao regime cartorial e patrimonialista da Torre do Tombo, no qual empresa estratégica é só aquela que alimenta a sanha do populismo arrecadatório, mediante fartos dividendos públicos.

*André Luís Vieira é advogado especializado em contratos complexos.

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