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02 agosto, 2025

Olhos que atravessam o solo: a nova fronteira do reconhecimento por drones


*LRCA Defense Consulting - 02/08/2025

Um drone equipado com tecnologia de radar de abertura sintética (SAR) está permitindo enxergar estruturas enterradas no subsolo com precisão inédita — como colônias de formigas, túneis ou pertences escondidos. Essa solução, desenvolvida no Brasil pela startup brasileira Radaz com apoio da Unicamp e aplicada em parceria com empresas como a Klabin, está transformando setores que vão da agricultura à arqueologia, passando por defesa e segurança pública, evidenciando seu uso dual.

Como funciona a tecnologia

Radar de Abertura Sintética (SAR): instalados em drones, transmitem sinais de baixa frequência (como na faixa P‑band), capazes de penetrar o solo e gerar imagens tomográficas do subsolo 

Padrões de voo sofisticados: trajetórias helicoidais permitem manter o radar sobre a área de interesse por mais tempo, melhorando a resolução tomográfica.

Inteligência artificial integrada: redes neurais profundas detectam padrões consistentes com objetos enterrados, como ninhos ou estruturas, com alta precisão.

Aplicações civis práticas
Agricultura e silvicultura
Na Klabin, a tecnologia foi testada em plantações de eucalipto para identificar ninhos de formigas cortadeiras a até 4 metros de profundidade. A taxa de acerto ficou em cerca de 80%, sem falsos positivos. Isso evita perdas significativas na produção e reduz o uso de inseticidas, ao detectar infestação de forma precisa e eficiente.

Mineração e geologia
Pode mapear subsidência de solos em áreas densamente vegetadas e detectar rochas até 100 metros abaixo da superfície — algo que satélites não conseguem com precisão similar.

Arqueologia
Projetos usam a tecnologia para localizar túmulos, objetos ou vestígios arqueológicos com mínima intervenção no solo. 

Aplicações em defesa e segurança pública
A capacidade de "enxergar" o que está enterrado sem contato físico com o solo abre um leque de aplicações estratégicas para uso militar e de segurança pública. Entre os possíveis usos estão:

Detecção de explosivos enterrados, minas terrestres e armadilhas: drones equipados com radar SAR de baixa frequência podem sobrevoar áreas suspeitas e identificar objetos metálicos ou cavidades artificiais, reduzindo o risco para equipes humanas e agilizando operações em zonas de conflito ou de pós-guerra.

Localização de túneis e esconderijos subterrâneos: em contextos de combate ao narcotráfico, contrabando ou terrorismo, a tecnologia pode identificar passagens escavadas sob fronteiras, favelas, presídios ou áreas de mata fechada — com mais precisão do que sensores térmicos ou satélites convencionais.

Reconhecimento tático e inteligência geológica: forças armadas podem empregar a tecnologia para mapear áreas de interesse estratégico, como terrenos acidentados ou potencialmente instáveis, ou para obter informações sobre infraestrutura oculta de oponentes.

Busca e salvamento: após terremotos, deslizamentos ou desabamentos urbanos, o radar pode ajudar a localizar vítimas presas sob os escombros ou áreas instáveis, guiando os resgates com segurança e rapidez. A tecnologia já foi empregada também em operações de busca a desaparecidos em terrenos alagadiços ou pantanosos, direcionando equipes para áreas promissoras.

O uso de drones SAR nesses cenários oferece a vantagem de operações remotas, discretas e não intrusivas, com risco reduzido e maior capacidade de cobertura. A adoção pela Defesa brasileira ou por forças policiais especializadas (como BOPE ou PF) ainda é incipiente, mas o potencial de aplicação é elevado — especialmente em um país de vasto território e diversidade geológica como o Brasil.

Exemplos internacionais do uso militar da tecnologia SAR em drones

Estados Unidos: as forças armadas norte-americanas já utilizam radares de abertura sintética embarcados em aviões e drones como o Global Hawk e o RQ-170 Sentinel para vigilância em tempo real e mapeamento do terreno — inclusive com sensores de penetração de solo para detectar túneis do cartel mexicano ao longo da fronteira sul.

Israel: além de radares SAR convencionais, Israel tem investido em drones táticos com sensores de penetração para localizar infraestruturas subterrâneas do Hamas, como túneis de contrabando e bunkers, em Gaza. A integração com inteligência artificial tem sido chave para diferenciar estruturas naturais de artificiais.

China: o exército chinês tem testado drones SAR de médio porte para mapeamento de cavernas e bunkers em regiões montanhosas e fronteiras críticas, com foco em dissuasão estratégica e capacidade de contrainteligência.

Por que essa inovação é relevante?
Custo reduzido e maior eficiência: grandes áreas podem ser mapeadas em poucos voos, sem necessidade de trabalho de campo intenso ou métodos invasivos.

Menor impacto ambiental
: escavações podem ser evitadas, mantendo sítios arqueológicos ou áreas agrícolas intactas até onde realmente houver algo enterrado.

Precisão aprimorada: a combinação de radar e IA minimiza falsos positivos e aumenta a confiabilidade dos resultados.

Desafios e perspectivas

Tipo de solo influenciando a penetração do sinal: solos argilosos ou úmidos podem limitar a profundidade alcançada pelo radar, exigindo ajustes de frequência e processamento 

Especialização técnica exigida
: desde a criação das trajetórias de voo até a interpretação dos dados de radar, são necessárias capacidades técnicas e conhecimento profundo da tecnologia.

Evolução constante: conforme miniaturização e sensores avançam, a expectativa é que drones SAR tornem-se ainda mais autônomos, podendo operar em enxames (swarm) e com processamento em tempo real.

Contexto no Brasil
A solução foi desenvolvida em parceria entre a Unicamp, a startup brasileira Radaz e a Klabin, dentro de programas de inovação como o PIPE da FAPESP. Trata-se da primeira vez no mundo que ninhos subterrâneos de formigas foram detectados com esse nível de acurácia usando tecnologia SAR embarcada em drone. 

O que vem pela frente?

Ampliação de usos: áreas como defesa, segurança pública, arqueologia, agronegócio, geologia e mineração devem continuar adotando essa tecnologia para detectar artefatos enterrados sem escavações.

Integração com outras tecnologias
: sensores como LiDAR e térmicos podem ser combinados, ampliando ainda mais o espectro de aplicação dessa abordagem.

Operação autônoma e enxames de drones
: sistemas que trabalham em cooperação poderão realizar mapeamentos amplos com rapidez e detalhamento.

Novo capítulo em exploração subterrânea
A união entre drones e radar SAR abre um novo capítulo em exploração subterrânea: é possível enxergar o que está oculto sem destruir o que está por cima. Seja para proteger plantações, acessar áreas geologicamente sensíveis ou realizar investigações forenses, essa tecnologia coloca o Brasil na vanguarda de uma revolução que combina mapeamento de precisão com inteligência artificial — uma verdadeira visão de raio-X do mundo real.

Além das imensas aplicações civis, o potencial para defesa e segurança pública é estratégico: drones com radar SAR podem localizar túneis clandestinos, armadilhas explosivas, esconderijos e outras ameaças invisíveis a olho nu, com baixo risco e alta precisão. Em um cenário global onde conflitos assimétricos, segurança de fronteiras e desastres naturais exigem respostas ágeis e tecnológicas, o radar embarcado em drones se torna uma ferramenta crucial para forças militares e operações policiais.


 Saiba mais:
- Radar RD350, da Radaz, em potenciais aplicações militares e de segurança 

12 março, 2024

Primeiro Seminário Nacional Economia de Defesa é apoiado pela ABIMDE

Evento será presencial, em Campinas, com transmissão on-line e inscrição gratuita

 

*ABIMDE - 11/03/2024

A Associação Brasileira das Indústrias de Materiais de Defesa e Segurança (ABIMDE) está apoiando o Primeiro Seminário Nacional Economia de Defesa - o 1° SENED, que será realizado no dia 10 de abril, no Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), no auditório Zeferino Vaz. O evento será presencial, com transmissão on-line mediante inscrição prévia, que é gratuita.

O 1º SENED é uma realização do Projeto Pró-Defesa IV da Unicamp, financiado pela CAPES/Ministério da Defesa, e tem o envolvimento de cinco outras instituições de ensino superior:  Escola Superior de Defesa (ESD), Escola de Guerra Naval (EGN), Universidade da Força Aérea (UNIFA), Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA) e Universidade Federal Fluminense (UFF).

O objetivo do encontro é promover e contribuir com o fortalecimento dos estudos, pesquisas e debates sobre temas relacionados à Economia de Defesa, além de criar espaço para a discussão e o desenvolvimento de estratégias que integrem os aspectos econômicos, com foco no fortalecimento e sustentabilidade do país na área de defesa.

Na programação, a abertura inclui uma sequência de atividades. Primeiro, a apresentação da Reitoria da Unicamp, seguida de palavras do Diretor do Instituto de Economia, Dr. Célio Hiratuka, do coordenador do projeto pela Unicamp, Dr. Marcos Barbieri, e do presidente da ABIMDE, Dr. Roberto Gallo.

A primeira palestra será com um convidado da Universidade Complutense de Madrid (UCM), o Dr. Antonio Fonfría da Mesa, professor de Economia da Defesa. Ele possui Licenciatura e Doutoramento em Ciências Econômicas e Empresariais, Mestrado em Economia Europeia (Instituto Ortega y Gasset), e diploma em Estudos Avançados de Defesa (CESEDEN).

Ao longo do dia, serão realizadas três mesas de discussão. A primeira terá como tema: “Orçamento de Defesa”, e será coordenada pelo Dr. Márcio Rocha (UFF), com participação de três debatedores: Luís Felipe Giesteira (Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços- MDIC), Peterson Silva (ESD/UNIFA) e Patrícia Matos (UNIFA).

A segunda mesa de discussão será sobre a “Base Industrial de Defesa”, com coordenação de Thauan Santos (EGN) e a presença dos seguintes debatedores:  Dr. Roberto Gallo (ABIMDE), Thiago Caliari (ITA) e Erika Ribeiro (Escola Naval).

“Ciência, Tecnologia e Defesa”, encerra as discussões do dia. A mesa será coordenada por Ligia Urbina (ITA), com participação de William Rospendowski (Finep), William S. Moreira (EGN) e Mariano Laplane (Unicamp).

Para se inscrever acesse: 

https://docs.google.com/forms/d/e/1FAIpQLSc5myJ2wm9sPClOhDJLE4vyWRAUwnm7K4piumg6h4DJpfCGiw/viewform

27 março, 2023

Akaer recebe visita da diretora do Fermilab, responsável pelo maior projeto de física de partícula do mundo


*LRCA Defense Consulting - 27/03/2023

A Akaer recebeu, na primeira quinzena de março, a visita de Lia Merminga, diretora do Fermilab, em sua primeira vinda ao Brasil. O Fermilab (Fermi National Accelerator Laboratory) é responsável pelo maior projeto de física de partícula do mundo e conta com investimentos de mais de três bilhões de dólares pelo Departamento de Energia dos Estados Unidos, mais os investimentos de parceiros internacionais que juntos ultrapassam os cinco bilhões de dólares. A Akaer foi parceira na primeira fase do projeto, por meio da Equatorial Sistemas S.A..

Integraram a comitiva importantes representantes do Fermilab, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e do Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas - CBPF para celebrar as conquistas obtidas na primeira fase do Projeto LBNF/Dune, apoiados pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de S. Paulo - FAPESP, e dar continuidade às ações para a segunda fase. A Akaer reforçou durante o encontro, ocorrido nas instalações de São José dos Campos (SP), o interesse e a capacidade de suportar o Fermilab e os parceiros na próxima fase do projeto. Os representantes das entidades foram recebidos pelo CEO da empresa, Cesar Silva.

O projeto LBNF/Dune (Long-Baseline Neutrino Facility e Deep Underground Neutrino Facility) é um programa para a pesquisa de neutrinos e partículas elementares que possibilitarão investigar novos fenômenos subatômicos e ampliar o conhecimento sobre os neutrinos e seu papel na formação do universo.
 

15 janeiro, 2022

Defesa e desenvolvimento: as faces de uma mesma moeda

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Prof. Dr. Marcos José Barbieri Ferreira


*SAAB - 17/12/2021

O brasileiro passa, em média, 10 horas e oito minutos conectado, segundo um estudo da Hootsuite em parceria com a We Are Social. É fato e de conhecimento público que a internet está incorporada ao cotidiano da sociedade. Mas, o que se sabe do nascimento desta rede que a cada dia ganha mais adeptos?

Sua origem se deu em 1969, na indústria de defesa e no mundo acadêmico. A conexão em rede, então chamada Arpanet, surgiu para transmitir dados militares sigilosos e interligar departamentos de pesquisa nos Estados Unidos. Além da internet, o desenvolvimento de outras importantes inovações a partir do setor de defesa, transbordaram para o mercado civil.

Para detalhar a temática de investimento em Defesa para o desenvolvimento de um país, conversamos com o Prof. Dr. Marcos José Barbieri Ferreira da Faculdade de Ciências Aplicadas da Universidade Estadual de Campinas (FCA/Unicamp) e coordenador do Laboratório de Estudos das Indústrias Aeroespaciais e de Defesa (LabA&D) da Unicamp. Especialista em indústrias aeroespaciais e de defesa, ele também ministrou duas aulas do módulo Economia de Defesa no curso de extensão universitária em Relações Internacionais, com foco em Defesa, promovido pela Saab em parceria com o Programa Interinstitucional (Unesp, Unicamp e PUC-SP) de Pós-Graduação em Relações Internacionais San Tiago Dantas.

1.    Qual a importância do investimento em Defesa para um país e sua população?


O investimento é essencial para fornecer meios de defesa de forma autônoma e garantir a soberania, integridade e capacidade de desenvolvimento para um país e a sociedade. O Brasil, que tem necessidades amplas e heterogêneas, precisa de equipamentos de defesa que estão na fronteira tecnológica. Assim, precisamos que os investimentos sejam ainda mais prementes. Além disso, os recursos financeiros na área de Defesa podem levar a uma capacitação direta da indústria, tanto pelo desenvolvimento e pela manutenção dos equipamentos militares, quanto pelo efeito de transbordamento para o restante da estrutura produtiva, o que chamamos de spin-offs. Como exemplo, temos os primeiros computadores do Brasil, que surgiram na década de 1970 em grande parte decorrentes dos aportes da Marinha e depois da Força Aérea, na busca pela autonomia de uso. O investimento em Defesa não se reflete necessariamente no PIB, mas as atividades de pesquisa e desenvolvimento na área de Defesa, envolvendo empresas, centros de pesquisa e universidades foram fundamentais para o desenvolvimento científico e tecnológico dos países mais avançados.

2.    Qual é a sua avaliação quanto à inovação e ao processo de transferência de tecnologia do Programa Gripen brasileiro?

Temos uma dupla vantagem em relação ao Gripen. Primeiro, ele atende as nossas necessidades de plataforma aérea de combate com excelente relação custo-benefício. Segundo, trata-se de um projeto que vem permitindo a transferência de tecnologia por meio da participação de destacadas empresas brasileiras em diversas etapas de desenvolvimento da aeronave, incluindo engenharia estrutural, sistemas de visualização de interface homem-máquina e integração de armas, graças à parceria do Brasil com a Suécia. A execução do programa tem demonstrado que foi uma escolha acertada e uma parceria benéfica para todos. O Brasil se beneficiou do projeto Gripen e da transferência de conhecimento sueca. Por outro lado, acredito que a Suécia, a Força Aérea Sueca e a Saab também foram favorecidas pela capacitação e exigências brasileiras em todo o processo.

3.    Em julho, o senhor ministrou aulas no curso de Relações Internacionais, com foco em Defesa, do Programa Interinstitucional de Pós-graduação em Relações Internacionais San Tiago Dantas, em parceria com a Saab. Qual a sua opinião sobre essa iniciativa que contemplou jornalistas da imprensa nacional?

Uma das funções básicas da universidade é informar à sociedade. Particularmente na área de Defesa, em que o acesso a informações é muito restrito a determinados grupos. Então, a aproximação com jornalistas é essencial para que possamos promover o conhecimento nesta área. Ao mesmo tempo, tivemos a oportunidade de aprender com eles, ouvir suas demandas e compreendendo melhor o tipo de informação que a sociedade necessita. Além de formar profissionais de comunicação, contribuímos para que eles, por meio de seu trabalho, levem informações de alto nível sobre o setor de Defesa à sociedade. Espero que iniciativas como essa também sejam feitas em outras áreas.

4.    Ainda sobre o curso de Relações Internacionais para jornalistas, qual a sua avaliação sobre a aula e a participação dos alunos?

Espero que todos tenham gostado e aproveitado tanto quanto eu. Foi uma excelente oportunidade para troca de ideias, com jornalistas especializados no setor contribuindo para o debate com perguntas técnicas, e os da imprensa tradicional trazendo questões-chave relacionadas ao contexto macro da Defesa. Foi muito proveitoso participar de uma iniciativa de fomento do conhecimento para imprensa e, consequentemente, para o país. O desenvolvimento da indústria da Defesa gera demanda, conhecimento, emprego e renda para toda sociedade. Por isso, terminei minha aula com a reflexão sobre o binômio “defesa e desenvolvimento são duas fases da mesma moeda”. Nenhum país do mundo conseguiu ter um, sem o outro. Por isso, espero que essa iniciativa contribua para que a sociedade brasileira veja a importância do setor da Defesa.

5.    A Suécia é reconhecida mundialmente pelo sucesso da execução do modelo tripla-hélice de inovação. Na sua opinião, como o Brasil poderia intensificar a conexão entre academia, indústria e governo?

Em uma ponta, temos que ter um setor público com efetivo poder de compra, isto é, com recursos e capacidade de demandar adequadamente. Isso significa ter uma estrutura de análise para definir o produto de acordo com a real necessidade do país. A indústria aeronáutica é um exemplo bem-sucedido desta prática. Em outra ponta do tripé, temos as empresas que precisam ser tecnologicamente desenvolvidas. No Brasil, há poucas. Um exemplo é a Embraer, única grande empresa nacional do segmento de alta intensidade tecnológica. Precisamos ter empresas desenvolvidas no país, como ocorre na Suécia. Não adianta ter capacidade de engenharia e de conhecimento se não há mercado para os profissionais trabalharem ou aplicarem as tecnologias desenvolvidas. As universidades e centros de pesquisa, por sua vez, precisam de recursos quando surge uma demanda do governo e do setor privado. No Brasil a Academia tem grande capacidade de formar recursos humanos, além realizar pesquisas básicas e, mesmo, aplicadas. Mas quando pensamos em inovação, não será a Academia a aplicá-la. São as empresas que ficam com esse papel, como vemos na aeronáutica. Neste segmento, temos uma grande empresa brasileira, em parceria com uma companhia estrangeira bem estabelecida. O Estado e a Força Aérea têm atuado de forma exemplar por meio da COPAC (Comissão Coordenadora do Programa Aeronave de Combate) e do IFI (Instituto de Fomento e Coordenação Industrial). Por fim a Academia, que participa ativamente deste processo.

6.    Quais são as principais necessidades da indústria de Defesa do Brasil?

As necessidades são amplas e heterogêneas. Temos de ter condições de operar na Amazônia, que é totalmente diferente de atuar na Caatinga, na área urbana do Sudeste ou no Sul. O Brasil é um país continental que tem uma população relativamente grande, com recursos naturais e estrutura produtiva complexa. Ademais, faz fronteira com dez países da América do Sul e possui uma costa marítima imensa. Essas características fazem com que tenhamos uma grande importância do ponto de vista geopolítico, particularmente no Atlântico Sul. Para que o Brasil possa se desenvolver, é preciso ter uma estrutura de defesa que dê retaguarda para que se faça de maneira autônoma. Por isso, precisamos de equipamentos e de meios de defesa sofisticados, que estão na fronteira tecnológica, como meio de fortalecer as Forças Armadas em todas as áreas. Entretanto, quanto mais estratégico for o produto, maior a dificuldade para adquiri-lo no exterior. Nós podemos, no limite, até importar coturnos ou munições, mas não devemos importar equipamentos estratégicos como aviões de caça, submarinos e sistemas de comando e controle. Entendo que devemos desenvolver e produzir esses equipamentos estratégicos no Brasil e, quando não tivermos condições nesse sentido, possamos firmar parceria com países aliados e importantes estrategicamente para a nação, como dispõe a Estratégia Nacional de Defesa de 2008.

7.    Qual a relevância da indústria de Defesa para as inovações do mundo?


Existem dois tipos de inovação: a disruptiva, que rompe com o que existe, que cria o novo, e a complementar, também importante. Primeiro temos uma ruptura e depois de estabelecido o novo modelo, temos as inovações complementares ao longo do tempo, como vemos com no contínuo aprimoramento dos celulares e automóveis. A inovação disruptiva tem um grau de incerteza extremamente elevado. Por isso, quem promove essas inovações é o Estado, em grande parte através das aquisições militares. A necessidade de ser superior ao oponente – que pode ser real, mas em geral é potencial – fica à frente do risco econômico. Uma parcela significativa de inovações disruptivas provém da Defesa. Por exemplo, 10 entre 13 das tecnologias disruptivas integradas nos IPhones tiveram origem neste setor. É um pouco como funciona a indústria farmacêutica. Bilhões e bilhões de dólares foram investidos por governos ao redor do mundo para financiar universidades e empresas no desenvolvimento de vacinas contra a Covid-19. Não por acaso, as indústrias da Defesa e Farmacêutica são de altíssima intensidade tecnológica e estão entre as que mais promovem as inovações disruptivas.

8.    Nos últimos anos, tivemos uma redução em inovações advindas do setor de Defesa. Qual sua avaliação sobre esse cenário? Pode exemplificar soluções desenvolvidas com foco na indústria de Defesa Naval e que, a partir do transbordamento de tecnologia, foram incorporadas ao cotidiano da sociedade? (Exemplos de spillovers).

Estamos em um processo de transformação e grande parte das inovações disruptivas ao longo da história surgiu da área de Defesa. No século XV, Henrique VII, investiu na produção de canhões dentro do processo de centralização do Estado, alavancando a indústria de ferro da Inglaterra para o que seria a base para a Revolução Industrial. No século XIX, a necessidade do exército estadunidense de ter rifles com componentes padronizados que pudessem ser intercambiados foi a base da produção em massa da Segunda Revolução Industrial. E a própria internet nasceu no final da década de 1960, quando a Advanced Research Projects Agency (ARPA) do Departamento de Defesa dos EUA desenvolveu uma rede descentralizada de computadores para conter situações de ataque a uma central. Essas inovações tiveram papel-chave e decisivo no processo de evolução da estrutura produtiva.

9.    Comumente, as inovações surgem do setor de Defesa para o ambiente civil. Mas, há exemplos de situação inversa?

Geralmente, o fluxo maior da inovação disruptiva é do militar para o civil. O inverso, ou seja, civil para militar ocorre quando precisamos de produção em maior escala e custos menores. Parte considerável do desenvolvimento de componentes microeletrônicos teve significativo avanço com a expansão dos bens de consumo. A Defesa, por exemplo, realizou altos investimentos que permitiram criar os primeiros componentes microeletrônicos, utilizados inicialmente nos sistemas de guiagem de mísseis. Posteriormente, os componentes microeletrônicos passaram a ser utilizados em celulares, computadores e diversos outros bens de consumo, sendo produzidos em alta escala. Então, dependendo do equipamento de defesa, fica muito mais barato utilizar componentes civis quando possível.

10. Quais são as suas expectativas para o setor de Defesa e/ou de Aeronáutica para os próximos anos?

Depende fundamentalmente de como a economia brasileira vai reagir a profunda estagnação econômica pela qual passa desde 2015. A pandemia da Covid-19 agravou ainda mais a crise econômica, o que vem sendo prejudicial, principalmente, para os projetos na área de Defesa. É fundamental ao país recuperar a capacidade de crescimento e, mais do que isso, que se tenha um projeto nacional de desenvolvimento. Isso porque, como já foi dito, defesa e desenvolvimento são faces de uma mesma moeda. Como é que se justifica gastos crescentes em defesa, se não há recursos para isso. Nós temos potencial e essa é a palavra-chave neste processo. Temos potencial para fazer o país voltar a crescer e se desenvolver. E não só potencial por ser um país grande, com recursos naturais, mas o potencial da capacidade de criação, de inovação, de empreendedorismo, de conhecimento. Na Academia, batalhamos para que esse potencial torne algo efetivo.

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