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04 dezembro, 2025

Embraer e Aquarela Analytics aplicam IA para otimizar cadeia de suprimentos e preparam base para indústria 4.0


*LRCA Defense Consulting - 04/12/2025

A Embraer e a Aquarela Analytics concluíram um projeto de dez meses voltado ao uso intensivo de inteligência artificial (IA) e análise de dados para otimizar a cadeia de suprimentos da fabricante aeronáutica brasileira. Batizada de Smart Planning, a ferramenta analítica processou mais de dois terabytes de informações, oferecendo suporte avançado às equipes de compras e planejamento logístico da empresa.

Segundo Dimas Tomelin, vice-presidente de Estratégia, Digital e Inovação da Embraer, o sistema representa uma das principais apostas da companhia na transformação digital de seus processos industriais. “O Smart Planning é a ferramenta de dados mais moderna desenvolvida e integrada para tornar os processos da Embraer mais eficazes”, afirmou. O painel interativo permite monitorar materiais usados na produção de aeronaves e prever faltas ou excessos de estoque com base em modelos de IA — um avanço que, segundo o executivo, amplia a eficiência operacional e reduz desperdícios.

O projeto foi desenvolvido em parceria com a Aquarela Analytics, empresa catarinense referência na aplicação de inteligência artificial e big data em ambientes industriais. Ao longo do processo, foram combinadas a metodologia Agile da Embraer e a Cultura de Dados (DCM) da Aquarela, permitindo integrar equipes multidisciplinares e acelerar o desenvolvimento e a implantação do sistema.

De acordo com o CEO da Aquarela Analytics, Marcos Santos, o desafio foi transformar a imensa base de dados da Embraer em um ecossistema digital inteligente. “Aplicamos nossa expertise em análise de dados, algoritmos e plataformas de inteligência artificial para aprimorar, transformar e integrar o sistema operacional da Embraer. O resultado é uma base sólida para as próximas etapas da jornada digital da companhia”, destacou.

Digitalização e impacto no setor aeroespacial
A adoção de IA na indústria aeronáutica vem se intensificando globalmente, especialmente em áreas ligadas à manutenção preditiva, gestão de suprimentos e planejamento de produção. No caso da Embraer, o Smart Planning faz parte de uma estratégia mais ampla de digitalização voltada à Indústria 4.0, conceito que integra automação, computação em nuvem e análise de grandes volumes de dados.

Fontes do setor destacam que soluções desse tipo ajudam empresas como a Embraer a lidar com os desafios complexos de cadeias globais de fornecimento, altamente sensíveis a flutuações de demanda e gargalos logísticos. A integração digital de fornecedores e parceiros também fortalece a resiliência industrial da fabricante — considerada a maior exportadora de bens de alto valor agregado do Brasil.

Aquarela: plataforma nacional de IA ganha projeção
Fundada em Florianópolis, a Aquarela Analytics é uma das pioneiras brasileiras em inteligência artificial aplicada à indústria. Com presença em 15 estados e três países, a empresa oferece soluções de análise de dados, manutenção preditiva e roteamento inteligente, atendendo clientes como Mercedes-Benz, Scania, SolarBR Coca-Cola e a própria Embraer.

A companhia recebeu mais de R$ 10 milhões em investimentos da Votorantim Energia (atual Auren Energia) e foi premiada pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) como Empresa de Produto Inovador. Sua principal estrutura tecnológica é a Aquarela Data Platform (ADP), que automatiza a criação de data lakes e aplicações analíticas corporativas.

Embraer amplia integração digital
Com unidades em quatro continentes e mais de 9.000 aeronaves entregues desde 1969, a Embraer investe progressivamente em automação e digitalização de processos industriais. A meta é ampliar a integração entre áreas de engenharia, compras e produção, tornando seu sistema logístico mais flexível diante de variações de demanda global.

“A digitalização e o uso inteligente de dados aumentam a previsibilidade, reduzem custos e criam um ecossistema mais integrado”, resumiu Tomelin. “Esse é o tipo de inovação que nos mantém competitivos e sustentáveis no longo prazo.”

Saiba mais:
 - Embraer e Google firmam parceria em inteligência artificial 

Embraer avança em negociação histórica para vender KC-390 ao Marrocos

Negócio de US$ 600 milhões pode marcar entrada da aeronave brasileira no mercado africano e consolidar modernização militar marroquina

Imagem meramente representativa
 

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LRCA Defense Consulting - 04/12/2025

A Embraer está em fase final de negociações para vender entre quatro e cinco aeronaves KC-390 Millennium à Força Aérea Real Marroquina, em um contrato estimado em aproximadamente US$ 600 milhões. Se confirmado, o acordo representará um marco histórico tanto para a indústria aeroespacial brasileira quanto para a estratégia de defesa do país norte-africano.

Negociações em estágio avançado
Segundo fontes da mídia especializada e publicações do setor, as tratativas entre a Embraer e o governo marroquino encontram-se em estágio avançado, com expectativa de conclusão até o final de 2025 e primeiras entregas previstas para 2027. A fabricante brasileira já enviou delegações ao Marrocos para tratar dos detalhes técnicos e comerciais da operação.

Apesar dos sinais positivos, tanto a Embraer quanto as autoridades marroquinas mantêm discrição pública sobre o assunto. Até o momento, não houve comunicado oficial detalhando quantidade exata de aeronaves, valores ou cronograma definitivo de entregas.

O interesse marroquino pelo KC-390 foi oficialmente revelado em setembro de 2024, durante um encontro de operadores da aeronave, quando o Marrocos apareceu listado entre os novos clientes potenciais, ao lado de Chile e Emirados Árabes Unidos. Meses antes, em março, um KC-390 de demonstração realizou voos com membros da Força Aérea Marroquina nas cidades de Rabat e na Base Aérea de Kenitra, com recepção considerada extremamente positiva pelos militares locais.

Modernização de frota envelhecida
A aquisição dos KC-390 faz parte de um amplo programa de modernização das Forças Armadas Reais do Marrocos, que conta com um orçamento de defesa superior a US$ 12 bilhões anuais. O país busca elevar suas capacidades de projeção regional, especialmente nas áreas do Sahel e do Saara Ocidental, regiões estratégicas onde mantém interesses de segurança.

Atualmente, a Força Aérea Real Marroquina opera cerca de 14 aeronaves C-130H Hércules, incluindo duas variantes KC-130H utilizadas para reabastecimento em voo. Muitas dessas aeronaves possuem mais de quatro décadas de uso, o que gera custos crescentes de manutenção e menor disponibilidade operacional.

A substituição por KC-390 representa um salto tecnológico significativo. Enquanto os C-130H marroquinos enfrentam limitações de idade e disponibilidade, o jato brasileiro oferece carga útil de até 26 toneladas, velocidade aproximada de 870 km/h (470 nós) e capacidade de operar em pistas curtas ou semi-preparadas — superando em carga, velocidade e eficiência os turbo-hélices atualmente em serviço.

Capacidades e versatilidade operacional
O KC-390 Millennium é uma aeronave multimissão de última geração, desenvolvida pela Embraer em parceria com a Força Aérea Brasileira e outros parceiros internacionais. Incorpora tecnologia fly-by-wire, suíte completa de autoproteção (incluindo sistemas de alerta radar, alerta de mísseis e lançadores de chaff/flare) e compatibilidade com pods de reabastecimento padrão OTAN.

Essa versatilidade permite que a aeronave atue em diferentes papéis: transporte estratégico e tático, vetor de assalto aeroterrestre, evacuação médica, busca e salvamento, combate a incêndios florestais e reabastecimento aéreo para caças e helicópteros. Para o Marrocos, essas capacidades são especialmente relevantes diante dos desafios de segurança em seu entorno estratégico.

Dimensão estratégica e geopolítica
Se o acordo for confirmado, o Marrocos se tornará o primeiro operador do KC-390 no continente africano, um feito significativo para a penetração da Embraer em mercados emergentes. A escolha também reflete a estratégia marroquina de aproximação aos padrões OTAN e diversificação de fornecedores militares, reduzindo a dependência exclusiva de soluções norte-americanas.

A negociação ganha contornos ainda mais relevantes no contexto das tensões regionais, especialmente com a Frente Polisário, apoiada pela Argélia. A modernização da capacidade de transporte e projeção de força aérea torna-se, assim, uma prioridade estratégica para Rabat.

Cooperação industrial e offsets
Além da venda das aeronaves, o contrato deve incluir pacotes abrangentes de suporte logístico, manutenção e capacitação de pilotos e mecânicos. Há também a possibilidade de produção parcial das aeronaves localmente, o que fortaleceria a nascente indústria aeroespacial marroquina.

Em outubro de 2024, o governo marroquino assinou um Memorando de Entendimentos com a Embraer para lançar projetos conjuntos no setor aeroespacial, abrangendo aviação comercial, defesa e até mobilidade aérea urbana. A empresa brasileira vem estruturando uma cadeia de fornecedores no país norte-africano, o que pode facilitar acordos de cooperação industrial e offsets ligados ao programa KC-390.

Consolidação do KC-390 no mercado global
Para a Embraer, a venda ao Marrocos representa mais do que um contrato comercial: é a consolidação do KC-390 como alternativa competitiva aos gigantes Boeing e Lockheed Martin no segmento de transporte militar. Seria um dos maiores contratos já firmados pela fabricante brasileira com um país africano.

Atualmente, além do Brasil, o KC-390 já foi adquirido por Portugal, Hungria, Holanda, Áustria e Coreia do Sul. A entrada no mercado africano abre novas perspectivas de expansão em um continente que busca modernizar suas forças armadas e possui necessidades crescentes de transporte estratégico.

Enquanto aguardam a confirmação oficial, observadores do setor apontam que todos os sinais técnicos, comerciais e políticos indicam que o acordo está próximo de ser fechado, marcando um novo capítulo na projeção internacional da indústria de defesa brasileira.


Quadro Comparativo: KC-390 Millennium vs C-130H/KC-130H

Aspecto

KC-390 Millennium (proposto)

C-130H/KC-130H (atual Marrocos)

Situação

Em negociação (4–5 unidades)

Frota em operação, aeronaves envelhecidas

Carga máxima

~26 toneladas de carga útil

Volume e capacidade útil prática inferior

Velocidade

~470 nós (~870 km/h)

Inferior, com tempos de translado maiores

Tecnologia

Fly-by-wire, suíte de autoproteção moderna

Aviônicos antigos, custos de manutenção crescentes

Papel estratégico

Modernização, maior alcance no Sahel e interoperabilidade OTAN

Capacidade atual limitada por idade e disponibilidade

 

03 dezembro, 2025

Do deserto ao Leste Europeu: a ofensiva bilionária da Embraer para conquistar mercados estratégicos

Fabricante brasileira aposta em parcerias estratégicas no Oriente Médio e Europa Oriental para consolidar aeronave de transporte militar

KC-390 sobre a Polônia: imagem representativa


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LRCA Defense Consulting - 03/12/2025

O mercado global de defesa está em constante transformação, impulsionado pela necessidade de modernização das frotas e pela busca por soluções eficientes e adaptáveis aos desafios contemporâneos. A Polônia, em meio a um cenário geopolítico complexo, tem acelerado seus investimentos em defesa, com a meta de destinar 4,8% do seu Produto Interno Bruto (PIB) ao setor até 2026. Essa iniciativa inclui a renovação de sua capacidade de transporte aéreo médio através do programa "Drop", buscando substituir os veteranos C-130 Hercules.

Paralelamente, os Emirados Árabes Unidos almejam solidificar sua posição como um hub de carga militar e aviação de defesa na região do Golfo. A busca por aeronaves modernas e a capacidade de manutenção local são cruciais para essa ambição

Com foco nessas oportunidades, a Embraer está intensificando sua estratégia de internacionalização do KC-390 Millennium em duas frentes simultâneas que podem representar um salto qualitativo para a aviação de defesa brasileira: enquanto nos Emirados Árabes Unidos a empresa firma acordos para serviços de manutenção e suporte, na Polônia avançam planos ambiciosos para transformar o país em um centro de excelência europeu, com investimentos estimados em US$ 3 bilhões e a possível instalação de uma linha de montagem final da aeronave.

Os movimentos revelam uma abordagem sofisticada da fabricante brasileira, que busca não apenas vender aeronaves, mas criar ecossistemas industriais completos em regiões estratégicas, assegurando presença de longo prazo e abrindo portas para vendas futuras.

Emirados Árabes: a porta de entrada no Oriente Médio
Em novembro de 2025, durante o Dubai Airshow, a Embraer deu passos concretos para estabelecer presença nos Emirados Árabes Unidos ao firmar Memorandos de Entendimento com duas empresas locais de peso: a AMMROC (Advanced Military Maintenance, Repair and Overhaul Center) e a GAL (Gulf Aircraft Maintenance). Os acordos focam em serviços de manutenção, reparo, revisão e treinamento para o KC-390 Millennium, além de cooperação ao longo de todo o ciclo de vida da aeronave.

A escolha dos parceiros não é casual. A AMMROC é referência regional em serviços MRO para aviação militar, sendo o único Centro autorizado pela Lockheed Martin para o C-130 Hercules na região, justamente a aeronave que o KC-390 pretende substituir. Já a GAL possui mais de 5.000 funcionários de 71 nacionalidades e é a principal fornecedora de serviços do Ministério da Defesa dos Emirados.

"Esses acordos representam muito mais do que contratos de manutenção", analisa um especialista em defesa que preferiu não se identificar. "A Embraer está estabelecendo infraestrutura crítica que facilita a decisão de compra. Quando você tem MRO local, o custo operacional cai significativamente e a disponibilidade da aeronave aumenta." 

KC-390 sobre os EAU: imagem representativa

A janela de oportunidade
O timing dos acordos é estratégico. A Força Aérea dos Emirados Árabes Unidos opera atualmente 8 aviões C-130H/L-100 Hercules fabricados entre as décadas de 1970 e 1980, que se aproximam rapidamente do fim de sua vida útil. A necessidade de substituição é iminente, e o KC-390 oferece vantagens técnicas consideráveis sobre o veterano americano.

O KC-390 é mais rápido, com velocidade máxima de 870 km/h contra 540 km/h do C-130H, possui maior capacidade de carga em certas configurações e incorpora tecnologia moderna de aviônica e sistemas. Para um país com vastos recursos petrolíferos e histórico de investimentos robustos em equipamentos militares de última geração, a proposta brasileira chega em momento oportuno.

"O KC-390 atende à demanda dos Emirados por aeronaves de transporte tático modernas", explica Francisco Lemos, vice-presidente de vendas da Embraer. "É uma plataforma mais versátil e eficiente que o C-130 Hercules, com capacidade para operar em ambientes desafiadores como os do Oriente Médio."

Bosco da Costa Junior, presidente e CEO da Embraer Defesa & Segurança, ressaltou que a cooperação faz parte do “DNA” da Embraer e que a empresa vem construindo um ecossistema industrial na Europa e em outras regiões do mundo. Um ponto chave dessa estratégia é a decisão da Embraer de priorizar os Emirados Árabes Unidos para sediar um futuro "completion center" do C-390, focado na montagem final, customizações e suporte regional. Essa escolha representa uma consolidação dos laços com Abu Dhabi e um reposicionamento estratégico do cargueiro brasileiro no tabuleiro regional, ampliando a presença industrial da Embraer e abrindo portas para novas exportações em um mercado altamente disputado.

Obstáculos no deserto
Apesar do otimismo, a Embraer enfrenta desafios significativos nos Emirados. O principal é a ausência de tradição de compra de equipamento militar brasileiro. Historicamente, os Emirados Árabes Unidos privilegiam fornecedores americanos e europeus, particularmente em equipamentos estratégicos.

A competição com a Lockheed Martin, fabricante do C-130J Super Hercules (versão moderna do Hercules), é feroz. A empresa americana detém relacionamento consolidado com as Forças Armadas emiráticas e pode oferecer pacotes integrados com outros sistemas de defesa já em operação no país.

Além disso, até o momento, os acordos firmados não se traduziram em pedidos firmes de aeronaves e permanecem no nível de Memorandos de Entendimento, que estabelecem intenções, mas não garantem contratos comerciais.

Analistas estimam entre 60% e 70% a probabilidade de uma venda efetiva do KC-390 aos Emirados nos próximos 24 a 36 meses, condicionada à capacidade da Embraer de transformar os acordos de MRO em relacionamento comercial mais profundo.

KC-390 sobre a Polônia: imagem representativa

Polônia: o centro de excelência europeu
Se nos Emirados a estratégia é cautelosa e incremental, na Polônia a Embraer aposta alto. Em março de 2025, a empresa anunciou planos de transformar o país em seu centro de excelência na Europa, com investimentos estimados em US$ 3 bilhões ao longo de 10 anos e a criação de 5 mil empregos diretos e indiretos.

Os números impressionam, mas refletem a ambição do projeto: a Embraer busca parceiros para estabelecer uma linha de produção final do KC-390 em solo polonês, estimando investimento inicial de US$ 1 bilhão e 600 empregos só nessa fase. Seria a primeira linha de montagem da aeronave fora do Brasil.

"A Polônia é vista como parceiro estratégico ideal", afirma Frederico Lemos, executivo da Embraer responsável pelas negociações. "Tem localização perfeita para uma linha de produção na Europa, com 42% da cadeia de suprimentos do KC-390 já originada na União Europeia."

Um mercado em plena expansão
A aposta polonesa se fundamenta em dados concretos. A Polônia opera atualmente uma frota envelhecida de C-130E e C-130H Hercules, e embora vá receber mais 5 aeronaves usadas dos estoques americanos, a necessidade de modernização permanece crítica — especialmente após a invasão russa da Ucrânia, que elevou dramaticamente as preocupações de segurança em toda a Europa Oriental.

O Ministro da Defesa brasileiro, José Múcio, confirmou publicamente que o Brasil está em negociações com a Polônia para possível aquisição do KC-390. Uma venda polonesa seria duplamente estratégica: além da receita direta, validaria ainda mais a aeronave no exigente mercado da OTAN e abriria caminho para vendas em cascata a outros países do bloco.

E o mercado potencial é considerável. Áustria, Holanda, Suécia, República Tcheca, Eslováquia e Lituânia já demonstraram interesse ou anunciaram intenção de compra do KC-390. A instalação de uma linha de montagem no coração da Europa reduziria custos logísticos, facilitaria a manutenção e fortaleceria o argumento de "compre europeu", ainda que o projeto seja brasileiro.

"Para viabilizar a linha de montagem final, procuramos algo em torno de 20 aviões, que seria um bom número", explica Lemos. A Polônia sozinha poderia encomendar entre 8 e 12 aeronaves, com o restante vindo de outros países europeus.

A capacidade estratégica que falta
Um dos argumentos mais fortes da Embraer na Polônia é único: o KC-390 fornecerá, pela primeira vez, capacidade de reabastecimento aéreo independente ao país. Atualmente, a Polônia depende completamente de aeronaves de outros países da OTAN para essa missão crítica, que permite estender o alcance e o tempo de voo de caças e outras aeronaves militares.

Para uma nação de fronteira com a Ucrânia e crescentemente preocupada com a postura russa, a autonomia em reabastecimento aéreo representa ganho estratégico significativo. O KC-390 foi projetado desde o início com essa capacidade, utilizando o sistema probe-and-drogue (sonda e cesto).

O desafio técnico e as tensões políticas
Mas há um problema técnico que precisa ser resolvido. Os principais caças poloneses — os atuais F-16 e os futuros F-35 Lightning II — utilizam o sistema de reabastecimento flying boom (lança voadora), incompatível com o sistema padrão do KC-390. A Embraer terá que desenvolver ou integrar essa capacidade se quiser atender plenamente às necessidades polonesas.

"É um desafio de engenharia, não um obstáculo intransponível", pondera um engenheiro aeronáutico consultado. "O C-130 já foi adaptado para ambos os sistemas. A questão é quanto custará e quanto tempo levará o desenvolvimento."

Além do aspecto técnico, há tensões políticas. As relações entre os governos brasileiro e polonês atravessam momento delicado, com divergências em temas de política externa e direitos humanos. Embora negociações militares geralmente transcendam questões políticas momentâneas, o clima pode afetar o timing das decisões.

Para além das aeronaves
O projeto polonês vai muito além da linha de montagem do KC-390. A Embraer planeja instalar também um centro de revisão de trens de pouso para os jatos comerciais E-Jets E2 e um centro de conversão de aeronaves E190 em cargueiros — projetos que, somados, representam investimentos adicionais e centenas de empregos.

Em março de 2025, a empresa também assinou Memorando de Entendimento com o Instituto de Aviação Łukasiewicz para colaboração em tecnologias de voo do futuro, incluindo propulsão elétrica e híbrida, demonstrando intenção de relacionamento de longo prazo que transcende projetos específicos.

Os números já começam a aparecer. Em 2024, negócios entre a Embraer e fornecedores poloneses movimentaram US$ 30 milhões e geraram 1.350 empregos. São valores ainda modestos diante do potencial, mas indicam momentum crescente.

KC-390 sobre a Polônia: imagem representativa

Duas estratégias, um objetivo
Emirados Árabes Unidos e Polônia representam abordagens diferentes para o mesmo objetivo: consolidar o KC-390 Millennium como alternativa global ao C-130 Hercules e estabelecer a Embraer como player relevante no competitivo mercado de aeronaves militares de transporte.

Nos Emirados, a estratégia é de penetração cautelosa através de serviços, construindo relacionamento e demonstrando capacidades antes de buscar vendas diretas. Na Polônia, a aposta é ousada e estruturante, visando criar presença industrial permanente que transforme o país em plataforma de expansão europeia.

"São estratégias complementares", analisa um consultor de defesa. "No Oriente Médio, você precisa provar valor antes de vender. Na Europa, especialmente após a guerra na Ucrânia, há urgência e abertura para alternativas aos fornecedores tradicionais. A Embraer está aproveitando as janelas de oportunidade em cada região."

Os próximos 12 a 24 meses serão decisivos. Nos Emirados, a conversão dos Memorandos de Entendimento em contratos comerciais de MRO indicará se a estratégia de penetração está funcionando. Na Polônia, espera-se uma decisão de compra do KC-390 que viabilize ou não os planos de linha de montagem.

O grande salto da Embraer pode estar próximo
Para a indústria aeroespacial brasileira, está em jogo muito mais que contratos individuais. O sucesso dessas iniciativas pode posicionar o Brasil definitivamente como fornecedor global de equipamentos militares de alta tecnologia, quebrando décadas de domínio americano e europeu em mercados estratégicos.

A Embraer, que começou há mais de cinco décadas como fabricante de pequenos aviões regionais, pode estar às vésperas de seu maior salto: tornar-se uma das principais empresas globais de aviação militar. O KC-390 Millennium é a aeronave que pode viabilizar essa transformação se os acordos nos Emirados e na Polônia se concretizarem.

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