Carta de intenção
assinada ontem replica modelo do KC-390 e posiciona Portugal como porta
de entrada da fabricante brasileira na Europa 
*LRCA Defense Consulting - 20/12/2025
Na cerimônia de entrega das primeiras cinco aeronaves A-29N Super Tucano à Força Aérea Portuguesa, realizada em Beja, foi assinado um documento que pode mudar o panorama da indústria aeronáutica portuguesa: uma carta de intenção entre o Ministro da Defesa Nacional, Nuno Melo, e o presidente da Embraer para estabelecer uma unidade de produção ou montagem do Super Tucano em território nacional.
A iniciativa replica uma fórmula já testada e aprovada com o KC-390, aeronave de transporte militar que transformou Portugal num centro de certificação NATO e gerou lucros significativos para o Estado português através de modificações técnicas que permitem a revenda a outros países da aliança.
O modelo vencedor do KC-390
O precedente do KC-390 é fundamental para compreender a aposta da Embraer
em solo português. Quando Portugal adquiriu estas aeronaves de transporte,
desenvolveu modificações específicas para certificação NATO através da sua
Autoridade Aeronáutica Nacional. Este trabalho técnico permitiu que cada KC-390
vendido posteriormente a outros países membros da aliança gerasse entre 10 e 11
milhões de euros de lucro para Portugal.
Os resultados não tardaram: até 2025, a aeronave já havia sido comercializada para sete países europeus, incluindo Países Baixos, Áustria e República Checa. O projeto foi considerado o primeiro de Defesa em Portugal a efetivamente criar valor, envolvendo o tecido científico nacional e a indústria local, com o investimento inicial já sendo amortizado através das vendas internacionais.
"O que fizemos com o KC-390 demonstrou que este modelo funciona", afirmou fonte próxima ao processo. "Agora queremos replicá-lo com o Super Tucano, uma aeronave com enorme potencial no mercado europeu."
Portugal como porta de entrada estratégica
A escolha de Portugal não é casual. O país torna-se o primeiro na Europa a
operar o A-29N com configuração NATO, posicionando-se como centro de
treinamento de pilotos e certificação segundo os padrões da aliança. Esta
posição privilegiada é vista pela Embraer como a chave para abrir o exigente
mercado europeu.
O General Cartaxo Alves, da Força Aérea Portuguesa, revelou que o projeto já desperta interesse em várias forças aéreas europeias. Países como Holanda, Espanha e Itália surgem como potenciais compradores, sendo que a Real Força Aérea da Holanda é citada como o próximo cliente interessado, com o objetivo de substituir seus 13 treinadores Pilatus PC-7, que operam há mais de 36 anos.
A aeronave brasileira tem argumentos sólidos para conquistar este mercado: líder global na sua categoria, o A-29 Super Tucano foi selecionado por 22 forças aéreas em todo o mundo e acumulou mais de 600 mil horas de voo. Segundo executivos da Embraer, praticamente não tem similar no mundo com a função dupla de treinamento avançado e ataque leve.
A nova ameaça dos drones
O contexto geopolítico europeu atual acrescenta urgência ao projeto. Com a
Europa atravessando uma nova fase de preocupação com defesa, cresce o interesse
no emprego do A-29 em missões counter-UAS, ou seja, combate a drones não
tripulados — uma ameaça cada vez mais presente nos conflitos modernos.
O Super Tucano apresenta-se como solução eficaz e economicamente viável para esta missão, sendo mais barato que jatos sofisticados para operações anti-drone. O seu custo operacional reduzido, por ser turboélice, torna-o particularmente atraente para países que procuram capacidades operacionais sem comprometer os orçamentos de defesa.
"Vários países europeus necessitam de novos aviões de treinamento avançado e, simultaneamente, procuram soluções para a ameaça dos drones", explica um analista de defesa. "O A-29N responde a estas duas necessidades num só equipamento."
Investimento de 200 milhões de euros impulsiona indústria
nacional
O projeto do Super Tucano insere-se num investimento mais amplo de 200
milhões de euros na modernização da Força Aérea Portuguesa, dos quais 75
milhões serão aplicados diretamente na indústria nacional. Este montante visa
criar um grande cluster aeronáutico em Beja, gerando mão de obra qualificada,
fixação de pessoas e oportunidades de negócio.
O presidente da Câmara de Beja considera que a fábrica será um motor de desenvolvimento para a região, servindo como empresa âncora para atrair outras empresas do setor. Os sinais já são visíveis: em 2025 nasceram 60 novas empresas nas indústrias de Defesa devido ao clima de confiança criado por estes investimentos.
A presença da Embraer em Portugal não é nova. A fabricante brasileira detém 35% da OGMA, empresa portuguesa que já produz componentes para suas aeronaves e fornece suporte ao KC-390. Esta parceria deverá ser expandida para incluir o A-29N, aproveitando a experiência acumulada com modificações e certificações NATO.
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| Foto do portal Kiosque da Aviação |
Infraestrutura e cronograma
Beja já possui infraestrutura aeronáutica relevante, sendo a base da
Esquadra 506 que opera os KC-390. Esta vantagem logística reduz os
investimentos iniciais necessários para estabelecer a nova unidade de produção
ou montagem.
Embora não existam prazos oficiais divulgados, a experiência com o KC-390 e a rapidez na entrega das primeiras aeronaves A-29N - entregues um ano e um dia após a assinatura do contrato - sugerem que a Embraer e Portugal trabalham com eficiência. Especialistas estimam que a unidade de Beja poderá estar operacional entre 2,5 e 3,5 anos após a assinatura do contrato definitivo.
O modelo de produção deverá seguir a lógica já testada: componentes principais fabricados no Brasil, com montagem final e integração de sistemas NATO em Portugal, seguidos de testes e certificações finais em solo português.
Desafios e oportunidades
Apesar do cenário favorável, o projeto enfrenta desafios. A viabilidade
econômica da unidade de Beja dependerá do volume de encomendas europeias,
exigindo esforços comerciais sustentados. A capacitação de mão de obra
especializada será outro fator crítico, assim como a necessidade de navegar
pela complexidade das certificações NATO e da União Europeia.
A concorrência de fabricantes europeus tradicionais também não pode ser subestimada, embora o Super Tucano apresente vantagens competitivas claras em termos de custo-benefício e capacidades operacionais comprovadas em ambiente real de combate.
Por outro lado, as sinergias com a OGMA e o precedente bem-sucedido do KC-390 criam fundamentos sólidos para o sucesso da iniciativa. O fato de Portugal ter conseguido transformar o projeto KC-390 no primeiro de Defesa a criar valor real para o país, reforça a confiança de que o modelo pode ser replicado.
Perspectivas futuras
A carta de intenção assinada ontem representa mais do que um compromisso
bilateral entre Portugal e a Embraer. Simboliza a maturidade da indústria de
defesa portuguesa e a sua capacidade de se posicionar como hub estratégico na
Europa.
Para a Embraer, Portugal oferece acesso privilegiado ao mercado europeu e NATO, redução de custos logísticos e um modelo de negócio que incentiva o governo local a promover ativamente as vendas internacionais, já que cada aeronave vendida gera receita para o Estado português.
Para Portugal, o projeto promete retorno financeiro direto, desenvolvimento industrial e tecnológico, posicionamento estratégico como primeiro operador europeu do A-29N NATO, e revitalização econômica de uma região tradicionalmente menos industrializada.
As próximas semanas serão cruciais para transformar a carta de intenções em compromisso definitivo. O interesse já manifestado por países como Holanda, Espanha e Itália sugere que o mercado está receptivo. Se o timing geopolítico se mantiver favorável e as negociações avançarem conforme previsto, Beja poderá em breve consolidar-se como um dos centros mais importantes da indústria aeronáutica militar europeia.
A segunda aposta da Embraer em solo português parece estar alinhada com as estrelas, ou melhor, com as necessidades operacionais e orçamentais das forças aéreas europeias. Resta agora transformar intenções em realidade concreta, tijolos, equipamentos e, principalmente, aeronaves que decolem do Alentejo rumo aos céus da Europa e além.
Ficha Técnica:
A-29N Super Tucano
- Fabricante: Embraer (Brasil)
- Função: Treinamento avançado e ataque leve
- Operadores: 22 forças aéreas mundialmente
- Horas de voo acumuladas: +600.000
- Características: Turboélice, baixo custo operacional, capacidade counter-UAS
Contrato Portugal:
- 12 aeronaves (5 já entregues, 7 nos próximos 2 anos)
- Investimento total: 200 milhões de euros
- Investimento na indústria nacional: 75 milhões de euros
- Primeiro operador europeu com configuração NATO



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