Rússia transforma drones kamikaze em plataformas de
combate ar-ar e aeronave brasileira pode ser a solução para forças aéreas da Europa
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| Imagem meramente ilustrativa |
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LRCA Defense Consulting - 25/12/2025
A guerra da Ucrânia acaba de ganhar um capítulo preocupante
que pode redefinir o futuro das vendas de aeronaves anti-drone. Em dezembro de
2025, a Rússia implementou uma nova versão do drone Shahed-136 equipado com um
único míssil ar-ar R-60, criando um desafio inédito para as táticas de
interceptação aérea ucranianas — e gerando apreensão entre os defensores do
Embraer A-29 Super Tucano.
A ameaça: drones com dentes
A Inteligência de Defesa da Ucrânia revelou que a Rússia adaptou o míssil
guiado por infravermelho R-60 da era soviética para implantação em plataformas
não tripuladas. O míssil está montado em um lançador APU-60-1MD integrado à
seção superior dianteira da fuselagem do drone Geran-2 (designação russa para o
Shahed).
A configuração não é simples. O drone porta duas câmeras de
rede — uma no nariz e outra atrás do lançador de mísseis — que transmitem vídeo
em tempo real através de um modem mesh chinês Xingkay Tech XK-F358. A
eletrônica embarcada inclui um computador Raspberry Pi 4 de origem britânica,
um módulo de rastreamento e dois modems GSM para telemetria, criando uma rede
de comando e controle resiliente.
O operador do Shahed deve apontar o drone diretamente para o
alvo e mantê-lo no campo de visão do míssil até que o sistema de busca
infravermelha consiga travar no alvo. Uma vez lançado, o R-60 rastreia
autonomamente a assinatura térmica do helicóptero ou aeronave-alvo.
Super Tucano: a resposta brasileira
Enquanto a ameaça dos Shahed armados cresce, a Embraer não
ficou parada. Em novembro de 2025, a fabricante brasileira apresentou um novo
conceito operacional que transforma o A-29 Super Tucano em uma plataforma
dedicada ao combate de drones.
A solução brasileira utiliza sistemas já integrados à
aeronave: sensores eletro-ópticos/infravermelhos para detecção e rastreamento,
datalinks para receber coordenadas de alvos, foguetes guiados a laser APKWS II
e as metralhadoras .50 montadas nas asas.
A velocidade de estol do Super Tucano de cerca de 80 km/h
significa que pode efetivamente engajar drones com velocidades de cruzeiro
lentas, permitindo acompanhar alvos que jatos mais rápidos teriam dificuldade
de interceptar. Com custo operacional de aproximadamente US$ 1.500 por hora de
voo - uma fração dos US$ 30.000 de um caça moderno - o A-29 oferece uma solução
economicamente viável para patrulhas prolongadas.
O confronto: capacidades técnicas - sistemas de autoproteção e vantagens do A-29
O A-29 Super Tucano pode ser configurado com dispensers de chaff e flares
especificamente projetados para despistar mísseis IR como o R-60. O sistema de
alerta de aproximação de mísseis (MAWS) e receptor de alerta radar (RWR)
detectam lançamentos via sensores infravermelhos ou ultravioleta, fornecendo
alertas direcionais para ativação imediata de contramedidas.
O míssil R-60 tem capacidade limitada de engajamento em
todos os aspectos, e o Shahed-136 é uma plataforma de lançamento lenta e não
especialmente manobrável que não foi projetada com combate ar-ar em mente.
O sensor eletro-óptico/infravermelho integrado permite detecção precoce de
drones como o Geran-2 equipado com R-60 a distâncias de até dezenas de
quilômetros. As configurações incluem datalinks para coordenadas de alvos e
visão noturna, priorizando neutralização do lançador antes do disparo.
Além disso, o A-29 pode ser equipado com armamento ar-ar
como AIM-9 ou MAA-1 Piranha para abater o drone porta-míssil a distâncias
seguras. As metralhadoras internas de 12,7mm oferecem precisão contra alvos
lentos, enquanto as características de alta manobrabilidade da aeronave minimizam a exposição.
Mercado global: a janela de oportunidade na Europa
Oriental
A efetividade de aeronaves leves já foi demonstrada na Ucrânia, onde foram
reaproveitadas para "caça de drones" improvisada, com uma unidade
modificando uma aeronave agrícola Zlin para carregar mísseis R-73 guiados por
infravermelho.
Helicópteros de vários tipos também tem sido usados para essa finalidade, mas, tanto as aeronaves de asa fixa improvisadas quanto as de asa rotativa se tornam alvos fáceis para os mísseis que agora estão presentes em alguns drones Shahed, haja vista não possuírem as defesas e/ou a manobrabilidade necessárias para enfrentá-los.
Polônia e os Estados Bálticos: novos mercados potenciais
A incursão de drones russos no espaço aéreo polonês em
setembro de 2025 mudou radicalmente a percepção de ameaça na Europa Oriental.
Aproximadamente 19 a 23 drones não tripulados russos cruzaram para o território
polonês, forçando a OTAN a abater aeronaves hostis pela primeira vez desde a
invasão russa de 2022.
O primeiro-ministro polonês Donald Tusk descreveu o
incidente como "o mais próximo que estivemos de um conflito aberto desde a
Segunda Guerra Mundial". A Polônia ativou o Artigo 4 da OTAN e a resposta
incluiu caças F-16 poloneses, F-35 holandeses, aeronaves AWACS italianas e
sistemas Patriot alemães.
O problema econômico é evidente: a OTAN gastou milhões
disparando mísseis contra drones que custam apenas alguns milhares de dólares
cada. Como analistas apontaram, o paradoxo da guerra moderna é que drones de
baixa tecnologia representam um risco tão alto para a segurança ocidental. Os
drones Gerbera que penetraram o espaço aéreo polonês custam aproximadamente US$
10.000 para serem produzidos, enquanto cada míssil AMRAAM usado para interceptá-los
custa cerca de US$ 1 milhão.
Mas a Polônia não está esperando pela União Europeia. Em
novembro de 2025, o vice-ministro da Defesa Cezary Tomczyk anunciou que o país construirá um sistema nacional de defesa anti-drone em meses, sem
aguardar a estagnada iniciativa de "muro de drones" da UE. Em breve, os
investimentos serão anunciados em tecnologia para detecção,
jamming e neutralização de drones hostis.
Nesse contexto, a Força Aérea Polonesa demonstra forte interesse no avião
brasileiro Super Tucano para missões de combate a drones, em um movimento que
pode consolidar a aeronave como a principal plataforma anti-drone da OTAN na
Europa.
Segundo informações recentes do portal Defence24, na entrevista concedida pelo major-general
Ireneusz Nowak, vice-comandante geral das Forças Armadas polonesas, a Força
Aérea do país está avaliando a possibilidade de usar plataformas aéreas
adicionais para combater alvos lentos e de baixa altitude, como drones suicidas
do tipo Geran-2 e Shahed.
Na entrevista ao Defence24, o general Nowak foi direto sobre o interesse no
Super Tucano: "Estamos pensando nisso. Vamos certamente testar o Super
Tucano e observá-lo mais de perto no início de 2026. Queremos formar uma
opinião sobre o assunto". O oficial enfatizou que a guerra moderna exige
criatividade e adaptação, e que todas as possibilidades disponíveis estão sendo
avaliadas, incluindo a adaptação de aeronaves M-28 e helicópteros para o
combate a drones.
Uma coalizão de países vulneráveis
Polônia, Estados Bálticos (Estônia, Letônia e Lituânia), Finlândia e
Noruega formaram uma coalizão comprometida em construir o "muro de
drones" para proteger suas fronteiras. A Lituânia já estabeleceu uma
unidade especial dentro de seu Serviço de Guarda de Fronteira dedicada ao uso
de VANTs para vigilância e defesa contra drones hostis.
Os Estados Bálticos excedem ou se aproximam da meta de 3% do
PIB da OTAN em gastos com defesa, com Estônia e Lituânia planejando atingir
pelo menos 5% do PIB em 2026. A Finlândia propôs hospedar uma base de drones de
reconhecimento da OTAN perto da fronteira russa, com a base aérea de Pirkkala
emergindo como escolha preferencial.
Esses países enfrentam violações regulares de seu espaço
aéreo. Em setembro de 2025, três caças russos voaram para o espaço aéreo
estoniano. A Romênia relatou incursões de drones russos. Aeroportos em
Copenhague, Oslo e Munique foram temporariamente fechados devido a avistamentos
de drones não identificados.
O A-29 como solução custo-efetiva
Para esses países, o A-29 Super Tucano representa uma solução
economicamente viável para um problema urgente. Com custo operacional de
aproximadamente US$ 1.500 por hora de voo - uma fração dos caças rápidos - a
aeronave pode realizar patrulhas prolongadas sem comprometer orçamentos de
defesa já sobrecarregados.
A capacidade de operar de pistas curtas ou não pavimentadas
é particularmente relevante para a geografia dos Estados Bálticos e regiões
remotas da Finlândia. A facilidade de manutenção significa menos dependência de
infraestrutura complexa de suporte.
Além disso, o A-29 oferece a combinação perfeita de
capacidades: pode voar devagar o suficiente para engajar drones (velocidade de
estol de cerca de 80 km/h), possui sensores modernos para detecção precoce, e
pode ser armado tanto para defesa (flares, chaff, MAWS) quanto para ataque
(metralhadoras, foguetes guiados, mísseis ar-ar).
A linha de produção da Sierra Nevada em Jacksonville
enfrenta lacunas de pedidos, tornando novos contratos especialmente atraentes.
A produção poderia ocorrer tanto nos Estados Unidos quanto no Brasil,
oferecendo flexibilidade para diferentes requisitos de aquisição dos países da
OTAN. A futura linha de montagem e finalização em Beja, Portugal, tornaria o A-29 uma solução "europeia".
Realidade do campo de batalha
Especialistas militares ucranianos confirmaram o primeiro caso documentado
de um míssil R-60 integrado a uma plataforma de drone Shahed. A primeira
interceptação bem-sucedida foi realizada por um drone interceptador Sting
ucraniano, desenvolvido pela Wild Hornets Charitable Fund. Nas imagens abaixo, postadas no perfil de Mazlum Kani Tan no LinkedIn, à esquerda está a imagem conceitual e, à direita, destroços de um drone russo Geran-2 portando um míssil R-60.
A Rússia lançou quase 50.000 drones Geran/Shahed contra a
Ucrânia desde a invasão em grande escala de 2022, mudando para um ritmo quase
contínuo de ataques que sobrecarregam defesas. Somente em 2025, foram lançados
mais de 38.000 drones de longo alcance e iscas entre janeiro e novembro.
Implicações estratégicas
A conversão de drones kamikaze em plataformas ar-ar representa uma
adaptação tática significativa. A Rússia está efetivamente criando "caças
de escolta" para seus drones de longo alcance ao equipar alguns Geran-2 com
mísseis R-60.
Para forças aéreas ao redor do mundo, isso exige reavaliação
de táticas de defesa aérea e contramedidas. A Ucrânia já confirmou que está
adaptando procedimentos de voo e defesa aérea em resposta a essa nova ameaça.
O futuro: defesa da fronteira oriental da OTAN
Mais de 22 forças aéreas operam o Super Tucano, com a aeronave acumulando
mais de 600.000 horas de voo mundialmente, muitas das quais em situação de combate real. Seu apelo está na praticidade: pode
operar de pistas curtas ou não pavimentadas, é fácil de manter e custa muito
menos para operar que um jato rápido.
A OTAN está expandindo sua presença no Báltico através da
Operação Eastern Sentry, com múltiplos países contribuindo com equipamentos de
defesa aérea. A República Tcheca enviou helicópteros Mi-171Sh e 100 soldados. A França destacou caças Rafale. A Holanda forneceu sistemas Patriot e NASAMS. A Suécia enviou caças Gripen adicionais. O Reino Unido considera redesdobrar
Eurofighter Typhoons.
Mas a questão persiste: gastar milhões em mísseis para
abater drones de apenas alguns milhares de dólares não é sustentável. A OTAN precisa de
soluções custo-efetivas que possam patrulhar continuamente o vasto espaço aéreo
da fronteira oriental.
A oportunidade da Embraer
Para a Polônia e os Estados Bálticos, o A-29 Super Tucano poderia preencher
uma lacuna crítica. Países como Polônia já investem 4% do PIB em defesa e
buscam ativamente soluções domésticas e internacionais para defesa anti-drone.
A Polônia está criando um Corpo separado de sistemas de armas não tripuladas e
tem aprovado o desdobramento de forças da OTAN em seu território.
Os Estados Bálticos, com economias menores mas gastos
proporcionais maiores em defesa, necessitam de soluções acessíveis que não
comprometam a eficácia. A capacidade do A-29 de operar em ambiente ártico
(relevante para Finlândia e Estados Bálticos) e sua comprovada resistência em
diferentes climas o tornam ideal.
A Finlândia, recém-integrada à OTAN, está desenvolvendo
infraestrutura de defesa significativa perto da fronteira russa e poderia se
beneficiar de uma aeronave versátil para patrulha e interceptação de baixa
altitude.
Sem opções brasileiras para a Ucrânia
É importante reconhecer a realidade política: o governo brasileiro atual
mantém sua posição de não fornecer equipamento militar à Ucrânia. Essa decisão,
independente de considerações técnicas ou comerciais, remove a Ucrânia como
mercado potencial para o A-29.
Entretanto, essa restrição não se aplica aos membros da OTAN
na Europa Oriental. Polônia, Estados Bálticos, Finlândia e outros aliados da
OTAN são mercados legítimos e urgentes que enfrentam ameaças semelhantes e
necessitam de soluções custo-efetivas.
O teste definitivo
Os especialistas e internautas que torcem pelas vendas do Super Tucano agora observam com
expectativa renovada. O A-29 enfrenta seu teste mais importante:
provar que uma aeronave turboélice brasileira, econômica e versátil, pode ser a
resposta para os países da OTAN que, na linha de frente, enfrentam uma das
ameaças mais inovadoras da guerra moderna.
A janela de oportunidade está aberta. Com a Polônia
construindo capacidades anti-drone independentemente, os Estados Bálticos
planejando aumentos significativos em gastos com defesa, e a OTAN reconhecendo
a necessidade de soluções custo-efetivas, o momento nunca foi mais propício
para a Embraer demonstrar que o A-29 é a plataforma ideal para a defesa da
fronteira oriental da Europa.